01/08/2019 às 12h32
Perdeu a chance de lucrar com a queda dos juros? Saiba o que fazer agora que a Selic caiu mais
Banco Central acaba de cortar a taxa básica de juros, reduzindo ainda mais o retorno das aplicações conservadoras; se você ainda não se preparou para este novo cenário de juro baixo, tenho uma notícia pra você…
Por Natália Flach | Para Exame
“E aí, preparada?”, me perguntou o tatuador.
“Não, nunca estou”, respondi.
Foi assim que começou a sessão de uma das minhas tatuagens, que fiz nas costas e doeu pacas. E é a mais pura verdade. Apesar de eu ter algumas tattoos grandes, já conhecer o processo e estar acostumada com a dor, a gente nunca está preparado para um negócio desses.
Quando a região é sensível, dói mesmo, e não importa quantas tatuagens você já tenha feito, nem quão durão ou durona você seja. E, se bobear, você ainda passa mal! (Lembre-se de comer e beber água antes de uma sessão de tatuagem.)
Mas nem toda a dor é assim. Com a preparação correta, algumas dores podem ser evitadas, ou pelo menos minimizadas. A dor no bolso, por exemplo.
Se você investe em renda fixa conservadora, aquelas aplicações cuja remuneração é atrelada à taxa Selic ou ao CDI, deve andar bastante insatisfeito com o retorno dos seus investimentos no atual cenário de juro baixo.
Pois na última quarta-feira (31), o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) cortou a meta da taxa Selic pela primeira vez desde março do ano passado, derrubando-a para de 6,50% para 6,00% ao ano.
Isso significa que a rentabilidade dessas aplicações mais conservadoras vai reduzir ainda mais. Nesta outra matéria, eu mostrei, em uma simulação, quanto vão render a poupança, o Tesouro Selic, os fundos de renda fixa conservadora e as LCI depois desse corte nos juros.
Quem acompanha o Seu Dinheiro há algum tempo já está careca de saber que esse movimento do Banco Central já era mais do que esperado. E que deixar todo o patrimônio aplicado em renda fixa conservadora nesse cenário pode ser a maior roubada.
Se o nosso leitor mais antigo não ficou só no plano da informação e partiu para a ação, certamente já estava preparado, tendo se posicionado nos ativos capazes de lucrar com a expectativa do mercado para a taxa Selic.
Afinal, o mercado já vinha antecipando os cortes de juros por parte dos bancos centrais americano e brasileiro, conforme apontava o comportamento dos juros futuros. A decisão mais recente do Copom só veio concretizar essa expectativa.
Agora, se você foi pego de surpresa por esse corte nos juros, ou se já sabia que o mercado vinha precificando essa queda e não fez nada a respeito, sinto informar, mas você já perdeu umas boas oportunidades de ganhar dinheiro.
A maior parte dos ganhos com títulos de renda fixa prefixados e atrelados à inflação meio que já foi. No caso dos títulos públicos, as valorizações chegaram à casa dos 20% no ano passado e dos 40% só no primeiro semestre deste ano. Também houve oportunidades em debêntures atreladas a índices de preços.
Ainda tem espaço para eles valorizarem alguma coisa. Mas, especialmente no caso dos títulos públicos, caso você ainda não tenha nenhum deles na carteira até agora e venha a se posicionar, é provável que seu retorno não seja mais lá grande coisa.
Mas então quer dizer que quem perdeu a chance de surfar a queda nos juros futuros não tem mais o que fazer agora que a Selic caiu? Está condenado a sofrer a dor de dezenas de agulhas no bolso?
Não, vamos lá: ainda dá para correr atrás do prejuízo. Ou melhor, do lucro. Se você ficou conservadorzão até agora, veja o que você pode fazer para melhorar o desempenho dos seus investimentos:
1. Escolha investimentos melhores para a sua reserva de emergência
Não tem muito jeito. Sua reserva de emergência e os recursos voltados para objetivos de curto prazo, para os quais o dinheiro não pode faltar de jeito nenhum, precisam permanecer aplicados em investimentos superconservadores e de liquidez diária, mesmo que eles estejam rendendo pouco.
Mas a poupança não é um deles, ok? A menos que você ainda tenha dinheiro na poupança antiga – que, no caso, está rendendo bem -, esqueça a caderneta. Esqueça também aquele CDB de banco grande que paga um percentual pífio do CDI.
Os melhores investimentos para a sua reserva de emergência hoje, em termos de risco e retorno, são o Tesouro Selic, título público que pode ser negociado pelo Tesouro Direto, e os fundos de renda fixa que aplicam exclusivamente em Tesouro Selic e que não cobram taxas, oferecidos atualmente pelo BTG Pactual Digital, pela corretora Pi e pela Órama.
Outros fundos DI que não invistam em crédito privado e tenham taxas baixas, sendo capazes de entregar perto de 100% do CDI, também são válidos.
E se você, por acaso, tiver acesso a algum título emitido por um grande banco – como CDB, LCI ou LCA – com liquidez diária e pagando um percentual alto do CDI, pode ser interessante também. Mas essas aplicações só costumam estar acessíveis a investidores com muitos recursos e bom relacionamento com a instituição financeira.
2. Corte os custos dos seus investimentos
Para ontem. Fundo de renda fixa conservadora com taxa de administração alta, corretora que cobra taxa de agente de custódia para investir no Tesouro Direto e plano de previdência privada com taxa de carregamento já não deveriam mais estar na sua carteira há muito tempo.
Se você investe em um fundo conservador que vem rendendo consideravelmente abaixo do CDI em razão de uma taxa de administração elevada, já passou da hora de trocá-lo por um fundo mais barato, que consiga, pelo menos, render cerca de 100% do CDI. Ou então por um desses fundos que não cobram taxa.
No caso do Tesouro Direto, a maioria das corretoras independentes e todas as corretoras de grandes bancos isentam seus clientes da taxa de agente de custódia, cobrando apenas a taxa de custódia obrigatória de 0,25% ao ano.
Se você ainda investe por uma corretora que cobra essa taxa, está comendo bola. Você pode, inclusive, transferir a custódia dos seus títulos públicos para uma corretora que não cobre taxa, sem problema algum.
Finalmente, no caso da previdência privada, já existe uma série de seguradoras que oferecem planos sem taxa de carregamento e taxas de administração mais baixas que os planos antigos.
Se a rentabilidade do seu plano atual estiver sendo sacrificada pelos altos custos, você pode pedir portabilidade para um plano mais barato, sem custo e sem precisar voltar a contar do zero o prazo de aplicação, o que poderia afetar a tributação do plano. Eu falo mais sobre como fazer portabilidade de previdência privada nesta matéria.
No vídeo a seguir, eu falo mais sobre os custos que você pode evitar ou reduzir, na hora de investir, de forma a aumentar o retorno das suas aplicações financeiras: assita o video
3. Separe seus objetivos em prazos! Nada de deixar todo o dinheiro da sua vida em aplicações conservadoras de liquidez diária
Deixe APENAS a sua reserva de emergência e o dinheiro para objetivos de curto prazo em investimentos conservadores que rendam próximo do CDI. Nada mais.
Se você já construiu um bom patrimônio, não tem por que deixar todo o dinheiro da sua vida em fundo DI, LCI e LCA de grandes bancos, poupança, CDB ou Tesouro Selic. Afinal, dificilmente você vai precisar de todo o seu dinheiro amanhã.
Acostume-se a pensar em objetivos e prazos para esses objetivos. O dinheiro que você não for usar imediatamente, aplique-o em alternativas mais rentáveis, mesmo que tenham mais volatilidade ou menos liquidez. Por exemplo, o dinheiro para quando você se aposentar, ou que você só pretende usar daqui a alguns anos.
Mesmo o seu bancão pode ser que ofereça uma aplicação mais rentável caso você abra mão da liquidez diária. Vale a pena verificar.
4. Busque ativos de maior risco
Embora alguns ativos que se beneficiam dos movimentos de queda nos juros futuros já tenham valorizado bastante, ainda dá tempo de se posicionar para ter retornos maiores que a renda fixa conservadora neste cenário de juro baixo.
Até porque, esse Brasil do juro baixo, pelo visto, veio para ficar por algum tempo. “Os juros estão baixos, mas devem ficar menores ainda. E devem ficar em níveis baixos por um período longo”, diz Marco Bismarchi, sócio gestor da TAG Investimentos.
Então não vai ter muito jeito. Para ter retornos melhores que os da renda fixa pós-fixada, o investidor vai ter que correr um pouco mais de risco em outras classes de ativos.
Mais do que isso: vai ter que diversificar. Não se trata de se jogar na bolsa de valores com tudo, mas de pelo menos começar a olhar com mais atenção para uma gama maior de ativos.
“Num universo de Selic elevada, a necessidade de diversificação não era tão clara. Mas com uma Selic baixa e juros reais abaixo de 1% ao ano depois de descontado o imposto de renda, o único caminho é a diversificação ampla”, diz Martin Iglesias, especialista em investimentos do Itaú Unibanco.
“Independentemente de qualquer coisa, os juros vão ficar baixos, no mínimo, até o fim de 2020. E, se subirem, vai ser só lá para 2021, e não mais para os níveis que víamos antes”, completa.
Além de Bismarchi e Iglesias, eu conversei com mais dois especialistas, de outras duas instituições financeiras, para saber onde aqueles investidores que ainda não se prepararam para o novo cenário de juro baixo podem se posicionar. Confira as orientações a seguir:
Fundos de ações
Para todas as casas, a bolsa é a principal aposta no atual cenário. E todos os especialistas foram unânimes em recomendar o investimento por meio de fundos ativos de ações, aqueles nos quais os gestores escolhem os papéis, e não simplesmente seguem o desempenho do Ibovespa.
Fundos multimercados
Mas, é claro, nem todo mundo tem perfil para investir em ações. Alguns investidores não suportam ver qualquer perda no seu portfólio nunca, jamais. Outros até toleram alguma volatilidade, mas apenas em uma pequena parte da carteira. Outros, ainda, pela idade avançada, devem se preocupar mais em preservar patrimônio do que em ter uma grande rentabilidade.
Nesse sentido, há outros ativos interessantes. Todos os especialistas com quem conversei recomendaram também fundos multimercados, aqueles que podem investir em diversas classes de ativos, incluindo ações, e que podem ter variados níveis de risco.
Eles são pedidas mais interessantes para os mais conservadores ou para aqueles que só vão botar uma pequena parte do patrimônio em fundos de ações.
Tesouro IPCA+ (NTN-B)
Na renda fixa, o grande movimento de valorização dos prefixados e títulos atrelados à inflação, como eu disse anteriormente, parece já ter passado. “Essa parte da renda fixa já foi”, diz Ronaldo Guimarães, head da plataforma de investimentos do Modalmais.
Ele e os demais especialistas acham que agora o espaço para ganhos, tanto com valorização quanto para levar o título até o vencimento, está nos títulos atrelados à inflação de prazo mais longo, o Tesouro IPCA+.
Mesmo assim, eles só devem ter altas mais modestas – ou, nas palavras de Ronaldo, não têm mais “muito suco” -, devendo receber apenas uma pequena parte da carteira do investidor.
O Tesouro IPCA+ pode ser comprado pelo Tesouro Direto.
Fundos imobiliários, debêntures incentivadas e dólar
Outro tipo de ativo recomendado por Ronaldo, e que pode ser interessante mesmo para os mais conservadores, são os fundos imobiliários (saiba como investir).
Já Alexandre Hishi, responsável pela área de gestão de investimentos da Azimut Brasil Wealth Management, considera os fundos de debêntures incentivadas como alternativas até mais interessantes do que o Tesouro IPCA+.
As debêntures incentivadas são títulos emitidos por empresas para financiar projetos de infraestrutura, sendo isentas de imposto de renda para a pessoa física. Por consequência, os fundos que investem nelas também são isentos. Eu falo mais sobre esses fundos nesta reportagem.
Finalmente, dois especialistas recomendaram também uma pequena alocação em dólar, de até 5%, apenas para proteção do portfólio.