Corações e mentes estão a mil no Brasil nestas últimas semanas, o imponderável virou rotina e aqueles dias onde não temos prisões mirabolantes ou notícias bombásticas parecem dias intermináveis. Estamos nos acostumando a morar em uma montanha russa, chamada Brasil. Não vamos aqui chatear o leitor com uma repetição dos fatos que estão amplamente noticiados nos jornais.  A ideia é tentarmos colocar um pouco de racionalidade em tanto caos.

Começando pelo começo. Um processo de impeachment não é algo tecnicamente jurídico. Não adianta o arrazoado de alguns de que não existe ainda uma Elba vermelha da presidente Dilma e de que um crime fiscal não seria motivo para impedimento. Não é assim que a banda toca. Um processo de impeachment é algo eminentemente político. Não tem a intenção de ser justo ou exato. É apenas político. Assim como demonizar o já politicamente morto Eduardo Cunha nos parece tão ineficaz como dar um tiro em um mensageiro de uma notícia ruim. Não altera em nada a natureza dos fatos.

Vamos aos fatos;

É economia, estúpido! A famosa frase do estrategista político de Clinton em sua campanha de 1992 contra George Herbert Walker Bush responde pelo fato da maioria da população (2/3 segundo as últimas pesquisas) querer ver Dilma pelas costas. Nos últimos 12 meses o PIB já cai 4,5%, uma estupidez sob qualquer ótica. O desemprego já caminha para dois dígitos, milhares de funcionários públicos já não recebem o seu salário ou recebem parte dele, as empresas tem queda de vendas na casa de 20/30/40%, muitas simplesmente fecham as portas e deixam as cidades parecendo fantasmas com seus pontos comerciais vazios. Já não falamos de recessão e sim de depressão econômica. As empresas (de todos os tamanhos) foram submetidas em 2015 a um teste de estresse sem precedentes. Nossa visão é de que mais um ano assim (sem vendas, com custos em alta e sem crédito) irá nos levar a um número sem precedente de empresas quebrando e encerrando as suas atividades. O governo Dilma, que é responsável por boa parte dessa enrascada econômica, não é tido como competente e articulado para tirar o país da depressão econômica. Essa visão é compartilhada desde o PHD em economia até o simples pedreiro que perdeu seu posto de trabalho na construção civil.

Operação Lava Jato. É um ator importante neste processo de desmontagem do ‘way of doing business’ do Brasil. Segue a sua agenda própria e completamente dissociada de vontades políticas ou particulares. Desde o começo, o Juiz Moro disse que a operação iria onde os fatos a levassem. É o que acontece. Com 3 dezenas de delações premiadas e outro tantas dezenas de presos e condenados, nos parece que a operação se aproxima do topo da cadeia de comando. Isso ainda pode ter um componente de grandes mudanças no quadro político, não só no impedimento ou não de Dilma, mas principalmente na definição das peças políticas que continuarão sobre o tabuleiro.  Muitas peças ainda poderão ser alijadas completamente do jogo. No lado privado, fica claro que o custo de associações espúrias com o governo existe e talvez não valha a pena ser corrido. Quanto mais a Lava Jato deixar de ser uma exceção e outras Lava Jatos a sucederem, mais teremos a redução da corrupção. O efeito de curto prazo é esse que temos, mas no médio e no longo prazo o país sairá bem melhor.

Jogos Vorazes. A classe política tem uma frase antiga que diz que um político até pode carregar a alça do seu caixão, mas ele não se atira na cova com você. Os políticos, no momento, estão focados em uma coisa somente; sobreviver. Tal qual no filme. A votação pela manutenção da prisão do Senador Delcídio (preso recentemente) exemplifica bem isso. Não parece lógico que nesse ambiente os políticos pensem em proteger uma presidente tão impopular e com isso irritar uma população que começa a sentir as dores de uma depressão econômica. Isso será tão mais notado quanto mais essa insatisfação apareça (ou não) nas ruas. Cremos que mais um domingo de ‘um milhão na Paulista’ poderá fechar definitivamente o caixão de Dilma. Ou não, se esse milhão resolver ficar em casa.

O dia foi marcado por diversas consultorias ainda atribuindo uma baixa probabilidade de saída de Dilma. Discordamos. Esses processos quando iniciados adquirem uma dinâmica própria que isoladamente nenhum ator tem a capacidade de controlar. Para o entendimento disso, recomendamos a leitura da entrevista que Collor deu recentemente (http://fernandorodrigues.blogosfera.uol.com.br/2015/09/23/se-instalado-impeachment-de-dilma-e-irreversivel-diz-collor/). Cremos que Collor tem uma expertise nesse assunto que não pode ser ignorada. Claro que Collor não é Dilma e Dilma não é Collor. Mas a dinâmica é a mesma. Collor foi traído por gente que foi lhe beijar a face na véspera do impedimento. O PT, ao negar os 3 votos do Conselho de Ética, já trai Dilma e lhe entrega às feras. A lógica do partido é tentar salvar Lula e alguma narrativa de ‘vítima’ para 2018. E Dilma que se dane.

Não é porque acreditamos que a chance de Dilma sair é boa (mas não é 100%) que o processo será fácil. Cremos em meses a seguir onde toda a confrontação e a polarização da sociedade virá a tona. Estamos entrando na mãe de todas as batalhas. De positivo temos que finalmente saímos do modo ‘horror sem fim’ e estamos indo para o modo ‘fim horroroso’. Mesmo se Dilma escapar, vemos ainda algo de positivo, pois ao menos o tema impeachment sai da mesa e ela ganha alguma força política para fazer a reforma fiscal. Não é o cenário ideal para a economia, mas é algo melhor do que temos até então.

Olhando para os ativos financeiros. Não cremos que o comportamento será linear e homogêneo entre todas as classes de ativos. Temos alguns pontos específicos bem importantes.

·  Juros Nominais. O setor curto da curva opera menos por Dilma e bem mais pelo BC, em processo de aumentar os juros novamente para tentar manter a inflação em 6,5% em 2016 e 4,5% em 2017. Se Dilma sair, esperamos um novo BC ainda mais ortodoxo e que pode até puxar mais os juros do que Tombini no curto prazo para ganhar respeito. Com isso olhamos a ponta longa da curva como a grande vencedora no caso de Dilma saindo.

·  Juros Reais. Nossa visão é semelhante aos juros nominais, com a curva fazendo um formato de corcova de camelo onde os longos seriam claramente os ganhadores. Caso Dilma saia.

·  Bolsa. Já comemorou a abertura do processo com uma alta de 3%. Claramente é uma classe de ativos que tem muito a recuperar em uma saída de Dilma e com a montagem de um governo de coalizão que enderece as reformas básicas. O mesmo se aplica aos papéis externos soberanos e privados, que hoje tiveram um dia neutro em relação ao evento. Cremos que um CDS de 450 pontos poderia facilmente se ajustar em 300-350 com a saída de Dilma. Se ela não sair não vemos muito piora além dos 450-500 pontos. Pior do que isso é nível de preço de país em guerra civil.

·  Dólar. Cremos que a moeda contra o real pode negociar em uma faixa entre 3,70 e 3,80 enquanto o processo está em suas preliminares. Porém, com o prosseguimento do afastamento de Dilma ganhando corpo poderemos ver a moeda facilmente indo para algo entre 3,30 e 3,40.

E não podemos perder o pano de fundo do mundo. Temos ainda um mundo com muita liquidez, ativos externos bem valorizados e pouco premio lá fora. Basta que o Brasil dê a impressão aos gringos que está começando a se arrumar que teremos um caminhão de dinheiro atrás de nossos ativos com preços bem deprimidos.

Em resumo, o quadro está longe de estar definido, o processo não será linear nem homogêneo, mas podemos falar que os primeiros passos para o começo do fim da crise foram dados. É um dia de cada vez.

Stay safe yawl!