03/04/2020 às 18:46

FUGA DO RISCO FAZ DÓLAR TER MAIOR ALTA SEMANAL DESDE AGOSTO DE 2018 E BOLSAS CAEM

Por Agência Estado

Em mais um dia de aversão a risco, em meio ao contínuo aumento de casos de coronavírus no mundo e às constantes preocupações com o efeito disso tudo sobre a economia global, as bolsas, aqui e nos EUA, voltam a experimentar queda semanal, enquanto o dólar continua sua escalada, ao atingir novo patamar nominal recorde e ter a maior alta para esses cinco pregões, de 4,40%, desde agosto de 2018, antes da eleição presidencial. Com isso, a curva de juros sofreu importante inclinação. Hoje, a diretora-gerente do FMI, Kristalina Georgieva, afirmou que o mundo já está em recessão, em um quadro “bem pior do que a crise financeira de 2008”. Com isso, pouco adiantou mais um dia de avanço expressivo nos preços do petróleo, diante da expectativa por um acordo entre os grandes produtores, na próxima semana, para reduzir os volumes ofertados. Tanto que, mesmo com o avanço porcentual de dois dígitos do barril, os papéis da Petrobras cederam e ajudaram o Ibovespa a experimentar perda muito superior à de seus pares em Wall Street, de 3,76%, aos 69.537,56 pontos. Na semana, a queda foi de 5,30%, depois da alta de 9,48% nos cinco pregões de 23 a 27 de março. Seguiu pesando durante toda a semana, no caso dos ativos domésticos, o ruído político entre o presidente Jair Bolsonaro, a equipe técnica do Ministério da Saúde e os governadores. Em meio a isso, pesquisas mostraram, hoje, queda na aprovação do governo de Bolsonaro. No caso do câmbio, apesar de o real estar em movimento alinhado ao dos demais emergentes, pouco tem adiantado as intervenções quase diárias do Banco Central com venda de reservas. Hoje, aliás, as cotações aceleraram após a autoridade monetária, no fim da tarde, vender US$ 455 milhões ao mercado. No fim, o dólar à vista teve valorização de 1,15%, fechando no novo recorde de R$ 5,3270, perto portanto da nova maior máxima intraday, de R$ 5,3280. O quadro de busca por segurança, em meio ao prenúncio de um quadro bastante recessivo, após o payroll de março mostrar saldo negativo de 701 mil vagas, levou os juros curtos a caírem, enquanto os longos voltaram a acumular prêmios.

CÂMBIO

Em dia de pessimismo global, o dólar seguiu a avançar sobre o real, pari passu em relação a moedas de países emergentes. Passou a barreira dos R$ 5,30 e fechou a sessão renovando máxima histórica nominal, a R$ 5,3270 (+1,15%), com alta acumulada de 4,40% na semana – a maior desde 24 de agosto de 2018 (+4,89%).

Uma hora antes do fechamento, o Banco Central vendeu um total de US$ 455,0 milhões em leilão à vista de dólares, com taxa de corte de R$ 5,3010. Mas, logo em seguida, o movimento de alta voltou a ganhar tração fazendo a divisa americana oscilar na marca dos R$ 5,32 até o fim da sessão.

Francisca Brasileiro, da Tag Investimentos, ressalta que uma parte da saída de recursos de países emergentes é explicada por um forte movimento no mundo para recomposição de reservas em dólares por parte de bancos centrais e governos de vários países. Ela nota que, desde a crise de 2008, as emissões referenciadas na moeda americana dobraram e isso puxa a demanda sendo uma das razões para a falta de liquidez que se vê globalmente.

“Os governos estão correndo para refazer suas reservas, inclusive a China, que vinha se desfazendo desde a guerra comercial, agora está recompondo”, afirma ela. “Muito embora exista uma disfuncionalidade no mercado de moedas, o lastro mundial ainda é dólar”.

Com relação ao real, ressalta Francisca, há questões que conjugam com a saída de capital de não-residentes do país nesse grande “voo para a qualidade”. De acordo com um levantamento da TAG Investimentos, 67% do movimento recente de desvalorização da moeda local pode ser explicado pelo “achatamento” do preço das commodities, que são impactadas pela guerra de preços do petróleo. “E as moedas de outros emergentes exportadores de commodities também têm sofrido com isso, como Austrália e Rússia tanto em termos de moeda quanto em relação a ativos de risco”, diz lembrando que o real sofre muito embora, entre a maior parte de seus pares o Brasil seja o que tem um dos maiores volumes de reservas internacionais. “Mas essa leitura conta menos em situações atuais como a de grandes fluxos que estamos vivendo”.

Francisca acrescenta ainda que, desde que o diferencial de juros foi reduzido, o real tem sido usado de uma forma diferente pelos investidores. Como é uma moeda muito líquida serve de funding para transações feitas com outras moedas.

Para Alexandre Liuzzi, co-fundador e diretor de estratégia da BeeTech, além do momento de muita volatilidade por toda a toda incerteza que envolve esta crise peculiar – uma vez que ela se dá em duas frentes, sanitária e financeira – há pressão adicional pela conjuntura política e, mais, por todo um desmonte de expectativas que estavam postas com relação às reformas e o rearranjo das contas públicas.

“Havia uma agenda bastante positiva e uma expectativa sendo construída para melhora dos fundamentos macroeconômicos. Nesse momento, tudo está sendo engavetado e, com a necessidade de aplicação forte de recursos para amenizar os impactos na economia, damos passos para trás”, explica, ressaltando que a combinação desses diversos fatores pressionam muito o mercado cambial.

Hoje, na cena interna, pesquisas de popularidade mostraram aumento da insatisfação com o presidente Jair Bolsonaro. Datafolha e XP mostraram maior reprovação ao trabalho do presidente. No entanto, houve aprovação do trabalho comandado pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Mandetta recebeu afagos do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), após o Bolsonaro declarar que ele e seu ministro “não estavam se bicando”.

Como pressão externa, a divulgação de uma escalada de mortes de contaminações pela pandemia em NY também pesou. De acordo com o governador de Nova York, Andrew Cuomo, o Estado de Nova York registrou mais 562 mortes causadas pelo novo coronavírus, o maior número de óbitos em 24 horas, elevando o total a 2.935. Já o número de pessoas infectadas passou de 92.381 para 102.863, em um acréscimo de 10.482 novos infectados.

Mais cedo, pesou a visão de enfraquecimento da economia americana, com os EUA registrando 701 mil demissões líquidas em março, elevando a taxa de desemprego de 3,5% em fevereiro para 4,4% no mês passado, de acordo com o Departamento do Trabalho. O número superou as previsões de analistas consultados pelo Projeções Broadcast, cuja mediana era de corte de 100 mil postos de trabalho.