As múltiplas faces da economia

 

Diante do agravamento da crise política, analistas independentes engordam cardápio de hipóteses nas previsões para a economia. Confusos, os empresários não sabem para onde olhar.

Em apenas três meses, o ano de 2016 já reúne um farto cardápio sobre a cena de Brasília: delação de senador petista, presidente da Câmara denunciado, Polícia Federal na casa de ex-presidente e risco crescente de queda do atual governo. No Brasil deste ano, 
a política manda e a economia obedece. Domar números e traçar indicadores são, cada vez mais, tarefas para a ciência política. Planejar negócios virou quase um exercício de adivinhação. Empresários e investidores tentam encontrar luzes para as suas decisões em relatórios de consultorias especializadas em prever os rumos da economia. Mas há incerteza até entre os analistas. Para lidar com um ambiente tão volátil, a estratégia agora é dividir as previsões em múltiplos cenários. Quanto valerá o câmbio se houver 
o impeachment da presidente Dilma? E se ela ficar no cargo sem base apoio no Congresso? E se conseguir aprovar reformas?

Em tempos de calmaria, economistas costumam trabalhar com um cenário base. Se há nuances, apresentam mais duas hipóteses: otimista e pessimista. Em geral, a variável de dúvida é a economia global, e não os desdobramentos de Brasília, como é o consenso agora. A crise política começou a determinar as previsões no ano passado, com a abertura do processo de impeachment na Câmara. Quem ainda não dava tanto peso a esse item mudou de opinião no início do mês, após a condução corecitiva do ex-presidente Lula pela Polícia Federal e a delação do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) contra Lula e Dilma, revelada pela revista ISTOÉ. “Atualmente estamos com um cenário, mas estamos trabalhando para ter três”, afirma Thais Zara, da Rosemberg Associados. “O que influencia mais na elaboração dos cenários é o impeachment ter ganhado probabilidade.” A DINHEIRO ouviu especialistas de sete consultorias de análise e três bancos. Estes últimos são mais conservadores nos estudos, ao menos publicamente. Nas casas independentes, o cardápio de cenários é praxe e não é difícil encontrar quem trabalhe com até cinco hipóteses. “Geralmente você tem variações otimista e pessimista, com chances de 15% cada”, afirma Leonardo Bortoloto, da Aditus Consultoria Financeira. “Hoje está mais detalhado” Alguns analistas tentam inclusive quantificar os de maior chance, atribuindo percentuais de probabilidade para cada um.

São duas as tendências centrais no momento: uma com Dilma Rousseff no comando até 2018 e outra com uma saída antecipada (leia quadro abaixo). Entre os que calculam a probabilidade, o placar está dividido, com 50% para cada lado, na média. Há quem detalhe ainda mais, com subcenários. Se Dilma ficar, por exemplo, tudo pode continuar como está, sem grandes reformas e confiança em baixa. Pode piorar, na visão dos analistas, se houver radicalização, com medidas como o uso de reservas internacionais para o investimento. E pode melhorar se o clima mudar, e a presidente conquistar consenso para passar reformas. Dos três, o mais provável é a manutenção do status quo. O último cenário, mais otimista, é visto como uma possibilidade remota – não chega a 20% de probabilidade. 
Na outra ponta, uma saída antecipada de Dilma é vista sob três aspectos nas análises. Com o impeachment, o vice-presidente Michel Temer faria um governo de coalizão e conseguiria passar reformas, alterando as expectativas. Uma segunda hipótese seria Temer assumir, mas enfrentar resistência da oposição. Nesse caso, haveria uma euforia de início, mas caminharia para próximo do quadro atual mais adiante. A cassação da chapa Dilma-Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é um ponto intermediário entre os dois. Poderia ser positiva na reversão das expectativas, mas sua demora alongaria o quadro de paralisia atual.

Todas as variáveis políticas influenciam a expectativa para os indicadores. De acordo com o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, a saída antecipada da presidente apreciaria ainda mais o câmbio, que poderia recuar para R$ 3,30. Com Dilma, a tendência é oposta: caminharia em direção a um nível próximo de R$ 5,00. “É uma diferença muito grande, que há muito não víamos”, diz Vale. 
A consultoria trabalha com 70% chance de saída da presidente.

“A questão de R$ 1 milhão é saber como e quando vai ser, mas acreditamos que não passa de 2016, não tem mais espaço.” Na análise sobre a atividade, também há variações.  Para André Leite, sócio da Tag Investimentos, que assessora fundos de pensão e empresários a tomar decisões, a saída de Dilma em 2016 contribuiria para a retomada da confiança e poderia significar uma retomada do PIB no próximo ano, de até 1%. Se a presidente permanecer, a intensidade é a mesma, porém, com o sinal invertido.

Com tantos caminhos, uma dúvida permanece: para qual deles o empresário deve olhar? “Tem de ver quais são as premissas por trás dos cenários e avaliar quais os riscos e as oportunidades”, afirma Maurício Molan, economista-chefe do Santander. “Não basta olhar só um número.” No caso dos investidores, é comum usar métodos que combinem as hipóteses, ponderando cada uma.

Diferentemente das consultorias, o banco espanhol adota apenas uma previsão central. A alternativa serve apenas para indicar uma situação de estresse. O cardápio de cenários com mais possibilidades pode ser feito a pedido de clientes, uma demanda que tem crescido. Para Molan, a principal novidade é que neste ano se alcançou o cenário alternativo, algo raro, na sua avaliação. “O grau de deterioração foi tamanho que o cenário principal é o de estresse.”

Mesmo entre os analistas que trabalham com a expectativa de mudança, a sugestão é optar por cautela. A ordem é preservar a liquidez para enfrentar a crise, por mais que possam surgir oportunidades. As expectativas mais recentes do mercado para o PIB apontam para uma queda de 3,5% neste ano e avanço de 0,5% em 2017. Mas os números vêm sendo revisados com frequência e pendem para uma queda de 4% em 2016 e estabilidade ou leve recuo no próximo ano. Em 2015, o recuo foi de 3,8%.

Enquanto isso, a política não para de conturbar o ambiente. Na quarta-feira 9, Lula foi denunciado pelo Ministério Público de São Paulo, acusado de falsidade ideológica e por ocultação de patrimônio. A Procuradoria pediu sua prisão preventiva, repudiada por Dilma. No Congresso, petistas passaram a apoiar a nomeação do ex-presidente para um ministério, o que lhe daria foro privilegiado na Justiça. Nas ruas, as manifestações contra o governo, previstas para o domingo 13, ganharam o apoio de 100 entidades empresariais. Pelo que se pode ver, no que depender de Brasília e das ruas, não faltará material aos analistas. Para as empresas, o tempo é curto. Se a crise não tiver fim, pode acabar com os negócios.