Analistas citam novo ‘interregno benigno’ e dólar recua a R$ 3,764

Por Lucas Hirata | Para Valor, de São Paulo.

A sinalização de que os juros americanos não devem subir tão cedo pode representar uma oportunidade para os mercados emergentes. Tamanha é a importância da nova dinâmica – observada na China e na zona do euro – que alguns analistas começam a defini-la como um novo “interregno benigno”, expressão bastante usada há alguns anos para descrever um ambiente externo marcado por juros baixos e economias globais em recuperação gradual.

Ontem, o dólar recuou de forma generalizada contra as principais moedas do mundo, após o Federal Reserve sinalizar que o aperto monetário foi deixado para 2020. Numa lista de 33 divisas globais, as emergentes foram as mais beneficiadas pelo movimento global do mercado de moedas. Por aqui, o dólar caiu 0,66%, aos R$ 3,7641, depois de tocar a mínima de R$ 3,7386.

O Federal Reserve surpreendeu, novamente, com uma sinalização mais favorável a juros baixos ou “dovish” no jargão do mercado, diz Luiz Eduardo Portella, sócio e gestor da Novus Capital. Para ele, a nova postura do Fed vai abrir uma janela positiva para mercados emergentes, assim como foi visto em 2016. Para além dos Estados Unidos, a expectativa é que os próximos indicadores da China e da Europa se estabilizem, o que tende a ajudar num dólar fraco em todo o mundo. “Podemos ver a volta do interregno benigno”, resume.

Para Dan Kawa, diretor de investimentos e sócio da TAG, a sinalização do Fed veio um pouco mais tolerante à inflação que o esperado e abre espaço para a queda do dólar ao redor do mundo. “Os dirigentes não esperam alta de juros este ano e vão parar de reduzir o balanço até setembro. Esses dois vetores podem ser lidos como ‘dovish'”, diz o gestor. “Mantém o interregno benigno, especialmente para os ativos emergentes”, completou.

Vale dizer, contudo, que as incertezas com a desaceleração econômica global e as disputas comerciais arranham um pouco essa tese. Já para os ativos brasileiros, o risco gira em torno do ajuste fiscal. Ainda falta o governo fazer a lição de casa com a agenda de reformas, principalmente a da Previdência.

“Agora, o nível do dólar depende dos desdobramentos do quadro doméstico ligado à reforma da Previdência”, diz o economista Silvio Campos, da Tendências. “A postura do Fed zerou o fator externo da cotação. O dólar lá fora está mais estável, não tem tanto impulso. Agora a cotação depende do que vamos ver internamente. Se for aprovada uma boa reforma da Previdência, dá para esperar uma queda adicional do dólar.”

Ontem, o governo de Jair Bolsonaro entregou ao Congresso a proposta de reforma da Previdência dos militares. A iniciativa economizaria R$ 97,3 bilhões aos cofres públicos, mas a reestruturação de carreiras vai gerar despesa de R$ 86,85 bilhões. De acordo com um gestor que preferiu não ser identificado, ainda existe preocupação com a coordenação política no governo. “Não é pelos números em si, mas as divergências criam apreensão”, diz.