22/06/2021 às 17h22

Dólar fecha abaixo de R$ 5 pela primeira vez em mais de 1 ano

O movimento do dia foi influenciado pela ata do Copom e tom moderado de Powell

Por Marcelo Osakabe | Para o Valor de São Paulo

O tom mais duro com a inflação revelado na ata Copom, que desencadeou nova rodada de revisões altistas para a projeção da Selic, garantiu novo pregão de bom desempenho do real em relação ao dólar. Ajudada ainda pelo tom mais moderado do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, que enfraqueceu a leitura ‘hawk’ (inclinada à retira de estímulos) ue havia emergido na semana passada, o real teve força para, finalmente, fechar abaixo do patamar de R$ 5 por dólar, após dias flertando com o patamar psicológico.

No encerramento do dia, a moeda americana foi negociada em baixa de 1,12%, a R$ 4,9661. Esta é a primeira vez que o dólar encerra abaixo de R$ 5 desde 10 de junho de 2020, quando foi cotado a R$ 4,9334.

Com o resultado de hoje, o real também é alçado à divisa de melhor desempenho em 2021 entre as 33 moedas mais líquidas do mundo, com valorização de 4,45%.

O sentido da negociação do pregão deu as caras logo no início da manhã, quando o Banco Central divulgou a ata da reunião do Copom da semana passada. Ao revelar que uma alta mais intensa de juros já havia sido discutida naquele momento, o comitê reforçou seu tom mais ‘hawk’ (inclinado à retirada de estímulos) e fez investidores elevarem as apostas por uma alta de 1 ponto porcentual já no próximo encontro, em agosto. Após a divulgação da ata, Bank of America, Itaú e Kairós passaram a contar com elevação de tal magnitude no próximo encontro.

“A decisão do Copom na semana passada já tinha sido mais dura no sinalização de que estava vendo uma inflação mais alta e mais estrutural que cíclica. Hoje veio a confirmação de que o BC está disposto a acelerar alta de juros se inflação continuar mais pressionada e expectativas estiverem desancoradas, e isso acaba naturalmente achatando a curva e ancorando o câmbio”, diz o CIO da TAG Investimentos, Dan Kawa.

O profissional nota que, com uma Selic próxima de 7% no fim do ano, o Brasil voltará a sustentar um dos diferenciais de juros mais expressivos entre os mercados emergentes mais líquidos, o que deve beneficiar o real. “Olhando ex-post, é possível que a moeda brasileira tenha exibido esse desempenho abaixo dos pares justamente porque os juros estavam em patamar errado”, pondera.

Com a alta da Selic para 4,50% na semana passada, o Brasil já deixou para trás o México e a África do Sul na lista dos mercados emergentes que pagam mais juros nominais, ficando atrás de Rússia (5,50%) e da Turquia (19%). Nas projeções do Bank of America, no entanto, o real deve tomar o segundo lugar do rublo no ranking das moedas com maior diferencial de juros já no terceiro trimestre. O BC russo deve encerrar o ano com taxa básica de 6%, 1 ponto porcentual abaixo da Selic projetada. Já a Turquia encerra o ano com juro em 16,00%.

No início do dia, no entanto, havia ainda alguma cautela no exterior em relação ao depoimento de Jerome Powell no Congresso americano. Em especial, após o Fomc surpreender antecipando em um ano a previsão para o início da alta de juros. Powell, no entanto, manteve o tom moderado de outras aparições e voltou a tirar força do dólar ao reforçar que a inflação nos EUA tende a ser temporária.

Na semana passada, o dólar chegou a furar os R$ 5,00, mas rapidamente voltou a ser negociado acima desse patamar justamente pela reação à surpresa do Fomc. “O Fed atrasou um pouco essa reprecificação [do dólar abaixo de R$ 5,00]. No entanto, a leitura da ata acabou prevalecendo e, acredito que, com a moderação no discurso de Powell e também de outros dirigentes do BC americano, esse novo patamar deve se sedimentar”, diz Sergio Zanini, sócio e gestor da Galápagos Gapital. O profissional enxerga chance de o dólar baixar a R$ 4,70 ainda neste ano, a depender de como evolui o cenário para a inflação nos Estados Unidos. “Com uma Selic perto de 6,50% ou 7,00%, é possível sim. E vejo um risco de cair ainda mais”, diz, citando projeções de mercado que colocam o barril de petróleo na casa dos US$ 100. “Sabemos que essa é uma questão delicada para o governo. Se realmente se materializar isso, pode criar um risco inflacionário importante”, diz.