Concentração de ativos caracteriza mercado brasileiro

Por Luciana Del Caro | Para o Valor, de São Paulo

Uma rápida comparação entre a indústria de fundos de investimento no Brasil e no mundo evidencia bem o efeito dos juros elevados sobre a composição dos nossos investimentos: enquanto a renda fixa representava 65,3% do patrimônio da indústria brasileira em dezembro de 2016, a mesma categoria respondia por 24,6% no mundo, segundo dados da Anbima. Já a renda variável era a maioria da indústria mundial, com 47% do patrimônio, mas representava apenas 5,1% no país.

A categoria já chegou a patamares bem mais expressivos por aqui: 15,2% em 2007, ano de pujança no mercado de capitais. De lá para cá, os juros altos e a piora do cenário econômico inibiram as aplicações em bolsa.

“A manutenção de juros elevados por muito tempo dificultou a correta análise de risco e retorno. Os investidores são conservadores porque o CDI rende bem, com pouca volatilidade”, diz Carlos Eduardo Eichhorn, diretor de gestão da Mapfre Investimentos. A aproximação do Brasil aos padrões mundiais depende da queda dos juros – que está relacionada à melhora das condições fiscais do governo. Só quando (e se) isso ocorrer de forma sustentável, os brasileiros devem diversificar mais.

A expectativa é que esse processo de diversificação seja liderado pelos investidores institucionais (fundos de pensão, entidades abertas de previdência, seguradoras) – hoje os principais aplicadores da indústria, com cerca de 34% do patrimônio. “As fundações vêm discutindo a migração para investimentos de mais risco, por conta da queda nos juros. Mas elas se movem lentamente, até por questões de governança”, diz Guilherme Benites, sócio da consultoria Aditus, voltada a esse segmento.

Desde a segunda metade de 2016, os institucionais vinham aplicando em fundos multimercados e de ações por conta da redução dos juros no mercado secundário de títulos públicos. O rendimento das NTN-Bs caiu até chegar a pouco menos de 5% além do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no início de maio. Tendo que bater metas atuariais que giram em torno de IPCA acrescido de 4,5% ou 5%, eles já buscavam ativos com maior potencial de retorno do que as NTN-Bs. Mas, após a divulgação da delação de Joesley Batista, da JBS, os papéis voltaram a pagar taxas melhores, de 5,7% a 6% além do IPCA. Com isso, a migração para ativos de mais risco fica por ora suspensa, diz Benites.

William Eid Junior, coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getulio Vargas-SP, diz que a busca por investimentos de mais risco não depende apenas da queda dos juros, mas de mudanças no mercado de capitais: “A nossa bolsa tem poucas opções de investimento e grande volatilidade. Além disso, as corretoras precisam mudar a abordagem dos clientes, deslocando o foco do curto prazo para o longo prazo.”

No que diz respeito aos investidores de varejo, ele advoga outras medidas em prol da diversificação, como uma classificação mais simples dos fundos, que tornasse os produtos mais compreensíveis. Ele também considera necessária a busca pela diversidade – não de indicadores de referência para os fundos, pois destes já dispomos, mas sim de produtos baseados nos objetivos dos investidores. Ele cita como exemplo a criação de fundos para receber recursos destinados à educação dos filhos, com foco no longo prazo – são poucos os existentes, que trocam a possibilidade de liquidez diária por uma expectativa de retorno superior.

Outra vertente possível de diversificação, e que tende a ganhar força num possível ambiente de redução sustentável dos juros, é a geográfica, considera Marco Bismarchi, sócio da TAG Investimentos: “Os investidores brasileiros não se expõem a ativos no exterior, mas a queda dos juros deve mudar isso”, acredita. Para ele, após uma primeira onda de produtos que não ofereciam proteção cambial, a nova moda deve ser de produtos com proteção, de forma que o investidor esteja exposto somente às variações do ativo investido, e não da moeda – o que facilitará a comparação entre o desempenho do ativo no exterior com os locais.